Tenho e admito vergonhosamente uma certa desconexão com o rock nacional. Os medalhões do gênero eram mais velhos e quando descobria minhas primeiras notas tupiniquins, a banda nos holofotes era o Charlie Brown Jr.. As mais novas não me chamavam a atenção e seguia então sem identificação com meus compatriotas armados de guitarras.
Chico Science, Planet Hemp e Raimundos não existiam mais (não consigo por mais que tente, desassociar a palavra Raimundos do Rodolfo), e eu sacripanta dotado de um teclado, perigosamente estava começando a permanecer em um limbo cultural atordoante que aumentava ainda mais a minha já famosa ranzinice. Os Superguidis me sacudiram um pouco, mas em uma noite de sábado um batalhão de descontentes arrematou de vez meu ventriculo arterial mais pesado.
E tudo começou na porta de um bar...
O show era uma das comemorações do aniversário de um clube noturno aqui de São Paulo. A banda tinha um nome que lembrava os grupos dos anos 50 e 60, AURÉLIO E SEUS COMETAS. Mas a diferença era que por alguns minutos eu presenciava pela lateral direita da nicotina cambaleante de meu cigarro, uma cena desconexa da minha noção de banda de rock.
O vocalista Emir Ruivo ali, lado à lado com todos os que ficavam por alguns minutos esperando o corpo mover-se em direção da porta do clube. Conversando e distribuindo palavras para os passantes de maneira surrealmente real. Não havia ali um pingo sequer de estrelismo fabricado por gestos televisivos ou maniqueísmos de marionetes com cordas de aço dedilhadas.
Era tudo puro e bruto, de uma essência descomunal, por isso mais chamativo de atenção ainda. Pois em um mundo onde todos se conhecem apenas por meio de uma tela, relações tão reais podem confundir o seu descrente ser.
Mas essa energia de aproximação de elétrons foi desencadeada mais uma vez por uma explosão de corporativismo humanitário, quando o mesmo Emir antes do show convidava e a platéia para aproximar-se do palco. Literalmente de mesa em mesa, novamente deixando os deambulantes que agora repousavam em cadeiras trôpegas sem ação de defesa. Como na letra de Deixa Entrar, o amor pelo calor da platéia sabe o que é melhor para a banda. E assim se fez, mesmo com a casa não tão cheia, a energia que fluia por entre os acordes era palpável em todos os aspectos, fossem eles sensoriais, motores, sexuais e neurológicos.
Uma banda que entrega-se na mesma maneira que hipnotiza, em toneladas de carisma, rodeada de riffs e batidas que tem intrínsecas ligações com a jovem guarda, o rock inglês e um suingue tipicamente nacional. Pronto, estava eu, poço de bandas alternativas islandesas e canadenses, derrotado em todas as convicções por um trio paulistano quena distorção da guitarra e da noção do que é ou não padrão dentro de uma banda. Xeque mate...
Por isso a primeira entrevista com uma banda nacional aqui do GD tinha que ser com o AURÉLIO E SEUS COMETAS. O que acabou revelando outra grande surpresa...
A banda sai em turnê nacional esse mês de setembro e roda pelas pradarias verde-amarelas durante uma bom tempo. Essa adrenalina da estrada deu um toque especial às respostas, que transbordam a verdade de uma banda que não tem medo de colocar a alma para bater. Como o novo single, lançado essa semana (CORAÇÃO COMETA, que você ouve no meio da entrevista) diz, todo homem tem um coração cometa. E Emir, Mogli Kid e Pedro deixam um rastro de poeira cósmica por onde passam.
Os trapezistas dos riffs desse clube libertário dos descontentes, falaram assim com o GD:
Como está a vida depois do lançamento de Clube dos Descontentes? Mata-se um leão por dia (ou até mais) quando o assunto é divulgar o trabalho no cenário nacional?
(Emir) A vida está uma maravilha, embora o mercado esteja difícil. O Brasil é problemático. O mercado internacional, de Londres especificamente, é aberto e interessado nos melhores artistas pela razão óbvia: eles serão mais lucrativos que os fracos. Aí aparecem a Lady Gaga, a Amy Winehouse, o Kasabian. Investe-se na diferença. No Brasil, hoje, investe-se na semelhança.
(Mogli) Sim Fábio, a divulgação está nos dando bastante trabalho. O som costuma agradar a quem ouve, mas o resultado ainda não é o que gostaríamos que fosse.
(Pedro Nog) Dá um trabalho do cão fazer uma música bombar, Fábio! Mas em breve, muito breve, breve mesmo, Clube dos Descontentes vai estar bombando no país!
No show do Outs uma coisa já de cara chamou a atenção, Emir indo de mesa em mesa chamando o público pra próximo do palco. Vocês acham que diminuir o espaço entre a banda e o público é primordial? (A banda mostra uma postura muito diferente do messianismo de muita gente que prefere a postura: "olha eu sou o artista e vocês o público, cada um na sua").
(Emir) Eu não acredito em messianismo. Não quero ensinar nada a ninguém. Não sou melhor nem pior que ninguém que esteja ali. Apenas sou o artista, e tenho que me apresentar. Então não vejo porque não dar uma dançadinha com as pessoas, se der vontade.
(Mogli) Quanto mais próximo do palco o público estiver, mais contagiante será a energia. Se torna um ciclo: a energia do palco vai pro público, que volta pro palco. E isso tanto pra energias boas quanto ruins. Então sim, acho primordial diminuir o espaço entre os dois.
(Pedro Nog) O Emirzão é o cara no palco, ele deita! Acho que 50% do valor de um show é a nossa apresentação no palco, e 50% é a resposta do público. Quando o Emir chama o público para participar, o espetáculo fica muito melhor.
Todo mundo já se conhecia muito antes do nascimento de Aurélio e Seus Cometas. E também tocaram com outras bandas (Emir tocou em uma banda de reggae, Ruba Dub, Mogli no Xorumi tal e etc). O que veio na bagagem desses tempos? Existe alguma coisa dos tempos de Song Festival do colégio na banda?
(Emir) O Song Festival me deu a noção de merecimento. Lá, eu ganhei minhas bolsas no Alumni, que me permitiram e me deram um bom inglês. Sabia que eu precisaria me esforçar para ganhar. Infelizmente o macrocosmos brasileiro não me entendeu como o microcosmos da escola.
(Mogli) Dos tempos de amizade veio o entrosamento na convivência, já que conheço o Pedro desde o jardim e já estava bastante acostumado com a presença do Emir, pois ia muito à casa deles. Musicalmente falando a formação da banda não podia ser melhor pra mim, porque aprendi a tocar nas jam's que fazíamos no sítio da família deles. Quanto ao Xorumi, apesar de ter existido por pouco tempo, foi muito divertido e importante já que foi a minha primeira experiência com uma banda. Chegamos a nos apresentar em alguns lugares, mas dificuldade com o entrosamento era muito grande, e acabamos nos separando
(Pedro Nog) O que veio para mim foi o medo de palco. Nunca toquei profissionalmente antes dos Aurélios. Quando fiz meu primeiro show, na bateria, com uns 10 anos, para um ginásio lotado de gente, chorei porque não queria entrar no palco. No primeiro show com os Aurélios, já com 21 anos, tremi como um prisioneiro de guerra. Mas agora acostumei e fico tranquilo nos shows. Thx God
E por falar em sons antigos, tem muito do rock das décadas passadas no som do Aurélio. Como as influências entram na hora da composição? Chegam naturalmente ou existem momentos em que um olha pro outro e diz: vamos tentar algo na linha daquela banda.
(Emir) Quase sempre eles vêm naturalmente. Teve uma ou duas vezes, durante o processo de gravação, que eu disse a eles "olha, vamos tentar isso aqui" e mostrava uma referência. Mas isso é só para resolver problemas.
(Mogli) Em relação as composições, a única que fizemos juntos foi "Rock 'n' Roll" que saiu de uma jam, então ela demonstra bem a característica natural do nosso som, nesse momento. As outras são composições do Emir, mas que foram arranjadas pelos três. Muitas vezes, como a bateria foi o primeiro instrumento a ser gravado, o Emir tocava e falava: "Vai Sievers, acompanha". E esse era o primeiro passo pra arranjar a música. E outras tantas vezes ele já vinha com a pegada na cabeça.
(Pedro Nog) Nossos arranjos são bem naturais. Normalmente, no primeiro ensaio já sai o produto final.
De onde veio a idéia dos hu-hás no refrão de Deixa Entrar? Aliás, uma música que definitivamente hit certeiro em qualquer lugar do mundo. O título Back On The Chain Gang e a palavra Pretenders é a origem dessa traquinagem no refrão?
(Emir) Eheh. Sim, nós roubamos de Back On The Chain Gang.
(Mogli) O que você acha? hehehe
(Pedro Nog) Bons artistas roubam, maus artista copiam. Pode dizer na entrevista que essa frase é minha.
Esse segundo semestre de 2010 está marcado com talvez a maior quantidade de shows internacionais no Brasil. E ao mesmo tempo que acontece essa enxurrada, reuniões sobre o futuro dos festivais e o papel das bandas e organizadores mantém os nervos meio exaltados. Existe ainda aquela história de que é muito mais fácil uma banda de fora ter espaço pra tocar do que uma nacional?
(Emir) Não tenha dúvida. Mas é culpa nossa. Não adianta chorar.
Eles são mais competentes. Fazem tudo melhor, do som à publicidade. Se você tem grandes artistas no país, você consegue competir. Mas os medianos tomaram o Brasil.
Essas pessoas que você citou, das reuniões, são oportunistas despreparadas e arrogantes. Acho uma piada esse comunismo artístico que esse pessoal propõe. Numa dessas reuniões, eu ouvi o Miranda, que foi um grande produtor, mas não entende nada da área executiva, dizer, num tom de super elogio, que o pessoal dos Móveis Coloniais são "super organizadinhos" (nota do GD: eu assisti via internet essa reunião realizada no Studio SP, e o Miranda fala exatamente essa frase).
Música, arte, não é para ser organizadinha. Isso não é argumento artístico. É o mesmo que dizer que um jogador de futebol é bonito. Se ele não jogar, não adianta nada. Você ja imaginou o Brian Jones apresentando o Jimi Hendrix em Woodstock dizendo "olha, eis aqui um guitarrista que eu ouvi, é super organizadinho".
Quando esse tipo de valor começa a se sobressair, você nota o quanto está doente o mercado. E aí, qual chance você tem de fazer frente à um mercado que presa, genuinamente, pelo brilho? Brilhantes versus organizadinhos. Que chance a gente tem?
(Mogli) Depende da proposta do evento. Se for uma coisa de grande porte com certeza eles vão buscar artistas internacionais porque chama mais atenção e obviamente pela qualidade musical. Existem coisas interessantísimas no Brasil, mas ainda andam meio escondidos de uma forma geral. A divulgação que prima únicamente a qualidade musical e a que tenha espaço para novos artistas brasileros, não é líder de audiência. Isso dificulta muito pra que um artista nacional possa disputar um espaço com Rage Against, Killers, Scissor Sisters, e etc...
(Pedro Nog) Acho natural isso. O Brasil tem muitos bons artistas, mas -- acredito eu -- a Inglaterra e os Estados Unidos ainda criam a melhor música do mundo. Por isso eles têm tanto espaço aqui e em qualquer lugar onde forem tocar.
Um dos festivais é o SWU. Estão acontecendo seletivas (batalhas de bandas no estillo Escola do Rock), para músicos nacionais poderem participar do line up. Vocês acham que esse esquema de mini festival da Record bizarro funciona? Vocês foram procurados pelos festivais ou pelos organizadores das seletivas?
(Emir) Nós não fomos procurados por ninguém. O único festival que nos procurou foi o Release Alternativo de Goiânia.
Esse tipo de seletiva via internet/telefone só pode funcionar no Brasil numa escala muito grande (como o Big Brother, por exemplo).
Aqui nós não temos essa cultura de gostar dessas coisas. Em Londres, eles gostam. O país inteiro acompanha o Britain's Got Talent. No Brasil, quem assiste o Ídolos? Aí a coisa fica mais embaixo: quem vota na seletiva do SWU? Os amigos dos artistas. E quem ganha? Quem tem mais amigos com paciência para votar. Então, acho que no Brasil isso não funciona.
O que poderia ser interessante, eu acredito, seria fazer um crivo especializado e um popular e cada um valer uma certa quantidade de votos. Aí acho que poderia ser mais próximo do justo.
(
Mogli) Acho que depende do que o evento se propõe a realizar. Se o objetivo for apresentar bandas novas creio possa funcionar como um último estágio de seleção.
(
Pedro Nog) Sou viciado em jogos, então adoro a ideia de festivais com seletiva. Quem sabe na próxima não estaremos lá?
Desde que eu escutei a primeira nota de música, ouvia sobre a briga das pessoas que defendiam o rock nacional contra o rock gringo. Hoje essa briga parece ter voltado para os que gostam do rock nacional independente e o que faz sucesso em canais de tv ou as bandas de emocore colorido. Essa regurgitação californiana do punk colorido atrapalha ou ajuda separar quem é bom de que não é?
(
Emir) Eu acho que essa briga não ajuda, porque é briga de torcedor. É parecido com o que eu falei antes, o que tem que importar é a qualidade e não se ele é do time do indie ou colorido. Se a gente conseguisse ter a decência de ser a gente mesmo, seria um bem para a humanidade.
(
Mogli) Para as fãs do Restart eles são bons, para muitos eles não são bons. Elas gostam deles, muitos não gostam deles. Acho que ninguém ousaria dizer que Beethoven não é bom. Mas alguns gostam e outros não. Acho que o que importa no fundo é se o que a pessoa faz lhe traz prazer, sendo boa ou não. Pra quem gosta de apreciar, sempre vai ter coisa boa.
(
Pedro Nog) Num país com 190 milhões de pessoas, existe público para qualquer tipo de música. Os canais de TV, as estações de rádios e os sites da internet são milhares -- então ninguém precisa ouvir o que não gosta. Não há motivo para ficar brigando.
Sempre pergunto para as bandas gringas como é a relação delas com a distribuição de música gratuita na internet. Todos se mostraram a favor. Qual a posição da banda quanto a isso? Música de graça deprecia o trabalho?
(
Emir) Se essa for a tendência, não me importo. Eu, pessoalmente, não sou a favor.
Não que deprecie o trabalho, afinal a música é de graça na TV, no rádio, e todo mundo briga para estar ali. Acho apenas que existe uma roda muito grande dentro da música profissional, que inclui compositores, produtores. Principalmente esses dois ganham na venda. Se não houvesse venda, por exemplo, eu não poderia ter gravado
O Barquinho nem
Só O Ôme. Eu acho que seria uma grande perda para mim.
(
nota do GD2: O Barquinho, a regravação do clássico do cancioneiro brasileiro escrita por Roberto Menescal e Ronaldo Boscoli e já cantada pela riot girrll original brasileira Maysa, está no primeiro disco da banda A História de Aurélio e Seus Cometas Parte 1-A Ascenção, lançado em 2006. O disco é quase uma ópera rock que conta a história de Aurélio para formar uma banda. E Só O Ôme, do sambista Noriel Vilela, está no mais recente trabalho, O Clube Dos Descontentes)
(
Mogli) Dinheiro é consequência, música tem que ser ouvida por quem pode e por quem não pode pagar. Eu sou a favor.
(
Pedro Nog) Acho que a internet ajuda a divulgar a música e a banda. Depois, dá para fazer dinheiro com os shows. Sou a favor, também.
Aliás sobre isso existe um projeto que preconiza o pagamento de uma taxa pelo usuário para ter acesso ao que quiser. É uma saída viável?
(
Emir) Não sabia disso. É uma idéia justa, mas acho difícil controlar. Se for possível, sou favorável.
(
Mogli) Eu gosto da idéia da música ser liberada pra quem quiser ouvir sem pagar, e sou a favor dela.
(
Pedro Nog) Não conhecia o projeto, também. Mas parece legal.
Existem canções com letras cheias de picardias como por exemplo De Segunda à Segunda, outras vezes muito mais introspectivas como em A Tela , que é um poema musicado. É preciso estar mais "cafajeste" no bom sentido pra escrever as letras mais sarcásticas e mais "feeling blues" para as canções mais densas?
(
Emir) Eu acho que as mais sacanas não são menos densas necessariamente, mas sim, em geral é isso.
(
Pedro Nog) Sem dúvida. Depois de terminar um namoro de 3 anos, você quer escrever Tela; depois de pegar 2 gatas no mesmo fim-de-semana, você quer escrever Deixe Entrar o Amor.
Como foi trabalhar com Paul Waller (arranjador que já trabalhou com Björk, Seal, entre outros)
(Emir) O Paul Waller é um dos grandes arranjadores do Reino Unido. Ele me ensinou a ter um olhar diferente diante da música profissional. Além disso, é um cara simples e humilde, amigo dos alunos. A nossa sala era de alto nível, de forma que muito das aulas, talvez metade, eram bate-papos. E só de estar ali onde a tendência é criada, e não onde se segue como estamos acostumados, é outra coisa.
Emir também pinta, onde as cores entram na canção?
(Emir) Eu pinto telas em tinta acrílica. Não tenho paciência para esperar a tinta a óleo secar, e nem tenho o cuidado que é necessário para aquarelas. Sobre a convergência das duas artes, acho que está na motivação. É sempre a mesma, vem da observação e da vontade de contar uma história. Aí tem histórias que são mais fáceis de contar com palavras e melodias, outras com desenhos.
Próximo disco, ainda é cedo ou já surgram idéias?
(Emir) Já temos a idéia, mas ela obviamente pode mudar. Mas comercialmente, a gente precisa respeitar uma ordem. Ainda leva pelo menos um ano para sair o próximo.
(Pedro Nog) Ainda precisamos vender mais cópias do Clube dos Descontentes! Mas já temos material para dois álbuns depois disso.
Quais são os artistas nacionais e os gringos que influenciam cada um de vocês. Obviamente existem as influências, mas quem fala mais fundo??
(Emir) Eu realmente não gostaria de fazer essa lista, porque ela seria tão longa que vc não tem idéia. Mas vai de Beatles, Stones, Beach Boys a Roberta Miranda, Cauby Peixoto, Gilberto Gil, Mutantes passando por Smashing Pumpkins, Elvis Costello, Bowie, Dylan, Arnaldo, Tom Jobim, Menor do Chapa, Tati Quebra Barraco, Michael Jackson, Madonna. E vai muito, muito mais longe.
(Pedro) As influências são muitos, mas as principais são Beatles, Stones, Who e David Bowie.
(Mogli) Beatles, Killers, Abba, Strokes, Raulzito, Legião Urbana, Los Hermanos.
Junto com as discussões realizadas à respeito do funcionamento dos festivais, ainda aqui no Brasil existe a relação ruim com o ECAD. O músico João Parahyba inclusive postou uma carta aberta em um site (Scream & Yell do jornalilsta Marcelo Costa) sobre isso. Qual é a posição de vocês sobre isso? O ECAD mais atrapalha ou ajuda? Existem possíveis mudanças que poderiam melhorar essa relação?
(Pedro) Não tenho muito conhecimento sobre a indústria da música, o Emir é mais preparado para responder isso.
(Emir) Eu não tenho nenhum problema com o ECAD. Eles sempre me pagaram direitinho, nunca me cobraram abusivamente. Meu problema é com o Ministério da Cultura, porque eu não acredito que esse sistema de subsídios é justo, nem acho que é bom para a cultura, pois não valoriza a qualidade. Investimento inteligente é diminuir impostos para produtos artísticos, como instrumentos, equipamentos, empresas produtoras de eventos.
(Mogli) Nunca tivemos problemas com o ECAD.
A banda vai sair em turnê essa semana. Vocês vão passar por onde? Tocar fora do país é algo que é objetivo do Aurélio e Seus Cometas?
(Emir) Não necessariamente, embora aceitaria um convite. Eu não faço questão de tocar fora só pra impressionar o mercado brasileiro. Quero que se dane. Se a música for um sucesso em Portugal, toco em Portugal. Mas prefiro não tocar em Portugal para ninguém só pra dizer que toquei em Portugal.
(Mogli) Passaremos por Porto Alegre, Caxias, Londrina, Maringá, Florianópolis, Curitiba. Tocar fora do país me interessa particularmente, mas é um passo pra ser dado mais adiante.
(Pedro) O Emir tem o roteiro. Sem dúvida tocar no exterior é um sonho!
A quantidade de bandas cantando em inglês sempre foi razoável dentro do cenário, mas parece que esse número em dois anos aumentou. Vocês já cogitaram a possibilidade de mudar o idioma das letras? É realmente mais fácil compor em inglês, ou quem sabe escreve até em mandarim?
(Emir) Risos. Mandarim seria o máximo. Olha, eu tenho uma visão jungiana sobre composições em inglês ou em uma língua que não seja a sua: compositores inseguros. Quando o compositor tem, de alguma forma, vergonha do que ele vai dizer, ele prefere que não seja entendido. Tem uma amiga minha que compõe em francês e inglês. Uma vez eu perguntei porque ela compunha nessas línguas. Ela disse que em português tudo o que você fala soa brega. Não é verdade. O que ela fala é brega, em francês, inglês ou português. A única diferença é que a breguice não é compreendida e isso é um acalento para quem tem medo de se expôr. Mas quem não quer se expôr não pode ser artista. Quem não quer pintar o rosto não pode ser palhaço.
(Pedro) O inglês é uma língua muito sonora, qualquer coisa fica boa para cantar. Nós pensamos, sim, em gravar algumas coisas em inglês mas para lançar fora do Brasil. Aqui dentro, vamos de português, mesmo.
(Mogli) Quando componho é tudo em português, até porque meu inglês não é dos melhores. Não tenho problemas com artistas brasileiros compondo em outra língua, mas como não é a língua natural as vezes fica uma coisa meio forçada.
(nota do GD3: eu acho que "deixa entrar o amor" para o refrão é muito mais sonoro e poético que "let the love come in", no contexto da canção citada)
Minha timeline no twitter sempre tem algum mini post de fãs de vocês. Como é a relação com os eles? Eles estão aumentando em número (essa é a impressão que eu tenho) e tornando-se cada vez mais ativos. Manter a vida on line da banda ativa ajuda ou é algo que não faz diferença?
(Emir) Que legal! Olha, eu acho que a relação com os fãs é importante, essa proximidade é legal. Mas na verdade quem cuida do Twitter é nosso produtor, eu respondo algumas coisas pessoalmente, então não sei te dar nenhum dado sobre isso.
(Pedro) Estamos trabalhando duro para divulgar a banda, e cada vez mais pessoas estão curtindo nosso som. Hoje em dia, a internet é fundamental para qualquer nova banda.
(Mogli) Ajuda muito. Faz com que os fãs se mantenham interessados, além do prazer de poder falar com as pessoas que criam aquele trabalho que você tanto admira. Também é uma forma de feedback que nós temos.
Depois de mudar-me para São Paulo (há seis anos), pude acompanhar de perto os shows de bandas nacionais. Sempre vejo-as lutando pra coseguir levar uma quantidade de pessoas que muitas vezes é reduzida. Inclusive com bandas que são mais famosas, o público é pequeno e nem está lá por causa do show. Eu me lembro de assistir à um show do Rafael Castro em um casa da Vila Madalena onde era como se fosse uma festa particular, em relação à quantidade de pessoas. O que falta para lotar-se casas noturnas? Falta divulgação ou existe pouca mobilização para que a cena de bandas cresça mais?
(Emir) Acho que isso é um fenômeno mundial nas grandes cidades. Meu amigo assistiu o Mick Taylor em Londres que, olha só, foi guitarrista dos Stones, num clube com 100 pessoas. Isso, obviamente, não vai acontecer em Brighton, como não aconteceria no Guarujá, onde tem menos eventos competindo. É que em São Paulo, você vai ter no mesmo dia o Cauby Peixoto, o Sérgio Reis, o Jairzinho, a Céu, o Sepultura, o Aurélio e Seus Cometas.
(Pedro) São Paulo é como uma selva: sempre que você fizer um show, vai haver 10, ou 15, ou 20 bandas fazendo no mesmo dia. Então não é fácil lotar uma casa.
(Mogli) Essa é uma questão realmente muito interessante. O que eu posso dizer sobre esse assunto é em relação a nossa banda. Na metade de 2008 nós estavamos fazendo shows com bastante freqüência, e assim fomos conquistandos um “certo público”. Nessa época em um show com pouca divulgação, onde a atração era apenas nossa banda, iam 150 pessoas. Estavamos sempre sendo cobrados por shows. Mas acontece que em 2009 nós ficamos parados devido a viagem do Emir e do Pedro para a Inglaterra. Com isso nós perdemos uma grande parcela desse público. Resumindo, acho que a divulgação é essencial, mas se manter tocando também.
Sobre isso eu li uma entrevista do Daniel Belleza dizendo que é sempre assim, os shows não tem mais público, mas sempre que uma pessoa estiver pulando ele toca e com toda a força possível. É assim com vocês?
(Emir) É por aí. Para mim não precisa estar pulando. Se tiver uma pessoa que saiu de casa para me ver, acredito que ela tem direito de ficar sentada se quiser, eu vou tocar do mesmo jeito que toquei em Salvador para 500 mil pessoas.
(Mogli) Você tocar para poucas pessoas é um pouco frustrante na hora que você entra pra começar o show. Mas depois que começa acaba sendo no mínimo legal, e dependedo da energira das pessoas que ali estiverem pode se tornar algo extremamente agradável. Com certeza é muito mais interessante você tocar para 15 pessoas que curtem muito o show, do que para 100 que não curtem. Pelo jeito o Daniel também concorda com isso, (risos).....
(Pedro) Sem dúvida: mesmo que o show seja para uma pessoa, tentamos tocar o nosso melhor. Mas não é fácil manter a empolgação numa casa vazia...
Clube dos Descontentes apesar de todo o funk, soul e power pop, tem uma letra que é puro punk. De onde surgiu a idéia? Estava todo mundo muito puto com alguma coisa?
(Mogli) Isso ai é com o Ruivo...hahaha
(Pedro) A letra é do Emir, acho melhor ele contar.
(Emir) Eu estava. Foi uma má tarde que criou o primeiro verso e o refrão. O resto foi trabalhado.
Uma última observação:
Quando procurava as fotos para ilustrar a entrevista, sempre esbarrava nessas postadas. Mas nunca sabia quem era a autora das mesmas. E olha que elas estão espalhadas por muitos lugares.
Acabei descobrindo que elas são de autoria de uma talentosa menina que se chama LÍVIA RAMIREZ. E vendo seu trabalho no flickr (os links logo abaixo), descobri que já estivemos no mesmo show da Livraria da Esquina. Então está aí o crédito das fotos para ela.
Os lugares onde você pode achar o trabalho de Lívia são:
http://cargocollective.com/liviaramirez
http://hifrank-hifrank.blogspot.com/
http://www.flickr.com/people/liviaramirez/