quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

A CULTURA DA MOBILIZAÇÃO.....


O decorrer dos fatos atuais no Egito deixou claro uma coisa:
Mobilizações populares ainda são a melhor maneira de promover mudanças, sejam elas individuais ou territoriais. A máxima onda de dna pulsante dentro do globo pode trazer benefícios, quando o bem pretendido é nobre. Nada de movimentos classistas onde uma minoria grita por mudanças em seu próprio bolso.
Mas sim uma centelha que promove deslocamentos tectônicos, em idéias que fazem diferença.

Vivemos dentro de um mundo binário colaborativo (por mais que ainda a velha retórica teime em pulsar), onde não cabe mais o isolamento retornável. Idéias geram mudanças e para que elas aconteçam é necessário mobilizações grupais. Os sites que promovem o chamado crowdfunding (arrecadação de recursos finaceiros provenientes do consumidor final, para catapultar projetos culturais), tem uma vocação revolucionária de massa em sua genética.

O visitante do site escolhe o projeto que mais move seus ventrículos e contribui com uma quantia em dinheiro. O valor do investimento é retribuído com uma recompensa que varia de projeto para projeto. Está então formada uma rede de tráfico cultural potente. O consumidor tem acesso ao conteúdo e ainda por cima pode escolher aquilo que gostaria de ver, ouvir ou ter. Fica a idéia de que a mobilização de massas é poderosamente produtora de sinapses de arte pura, sem intermediários. O artista em contato direto com o consumidor.

Aqui no Brasil uma inciativa pioneira partiu de três cabeças pensantes. Diego Reeberg, Luís Otávio Felipe Ribeiro e Daniel Weinmann. A confraria colaborativa chamada CATARSE é a plataforma de crowdfunding brasileira, que inicia 2011 com ambições cada vez maiores e números que dissolvem qualquer tentativa de pessimismo quanto a relevância e sucesso do site. Em três semanas 15 mil visitantes, mais de 1000 pessoas cadastradas e um total de R$ 10.000,00 investidos em idéias mobilizadoras, que vão desde peças teatrais de dança até um projeto sobre sustentabilidade.

O GD conversou com Luis e Diego, os dois cavaleiros de Jorge que estão lutando para que a cultura possa ser algo de fácil acesso e cada vez menos elitizada.


Como surgiu a idéia de um projeto do tipo crowdfunding inteiramente nacional?

Na verdade são dois lados da história. O meu e do Luís, a idéia veio depois que a gente resolveu procurar modelos de negócios interessantes fora do Brasil, pois queríamos empreender em algo. Aí a gente conheceu o Kickstarter, site norte-americano que foi um dos pioneiros em crowdfunding. A gente ficou encantado pelo modelo, pois tinha tudo a ver sobre com a forma que pensavamos que um negócio deveria ter: colaborativo, conectado às mídias sociais, promover mudanças na sociedade.

Do lado do pessoal da Softa (empresa de Porto Alegre que também é sócia no Catarse), a ideia veio do Daniel Weinmann. Ele é músico, dançarino de tango e, pra ele, a idéia surgiu como uma necessidade de financiar seus próprios projetos. Só depois ele veio a conhecer o Kickstarter.

Nos dois lados, a gente viu que no Brasil era necessário uma iniciativa como essa, pois vimos que muitos bons projetos não conseguiam obter financiamento e ficavam engavetados por isso. Como uma parte importante do processo é a curadoria, sabíamos que os sites estrangeiros não conseguiriam atuar no Brasil sem uma equipe própria. Achamos melhor começar isso então nós mesmos, com uma plataforma que fosse do jeito que quiséssemos.

Nosso maior exemplo é o Kickstarter, principalmente por causa do alto nível dos projetos que pareciam por lá. Mas também estudamos outros sites para entender os prós e contra do modelo. O Sellaband, primeiro plataforma de crowdfunding, que surgiu na Holanda e teve a música como seu foco também foi outra inspiração. O Ulule e o Fundbreak (que mudou seu nome agora para Pozible) também foram boas inspirações.

O projeto Catarse, dentro do seu tumblr, está constantemente colocando no ar notícias sobre outros sites do gênero. O projeto brasileiro mantém uma network com algum desses fora do país? Existe alguma idéia nesse sentido?

A gente teve contato com os responsáveis pelo Ulule, que foram sempre atenciosos. Mas, na verdade, nosso principal contato fora do Brasil é com o Gijsbert Koren , principal responsável pelo blog Smarter Money, que trata basicamente de crowdfunding, e um dos empreendedores por trás do CrowdAboutNow, plataforma de crowdfunding sediada na Holanda com foco em financiamento de empresas.

O público brasileiro que consome cultura já entende a idéia da Catarse? A receptividade está em que nível?

Na verdade a gente acha que ainda pouca gente conhece a idéia, mas a receptividade de quem já conheceu é muito grande. É normal haver dúvidas “E quem garante que o projeto vai ser executado? E se não me entregarem a recompensa? E se o dinheiro levantado não for suficiente?”, mas acho que ao compreenderem melhor o modelo – e a gente está mais do que disposto a responder essas dúvidas – o crowdfunding se consolidará em diversos meios.
Em pouco mais de 3 semanas desde que o Catarse está no ar já temos mais de 15 mil visitantes únicos, mais de 1000 pessoas cadastradas no site e 10 mil reais investidos nos projetos, acreditamos que são ótimos números para um site – e um modelo – iniciante.



Como vocês selecionam os trabalhos que serão colocados no site?

Primeiramente observamos se a ideia por trás do projeto bate com o mínimo de qualidade que queremos para o site. Não precisa ser algo inteiramente novo, mas tem que ter algum que de diferente, fora do comum, até meio louco (num bom sentido). Aqui o critério é mais subjetivo, lógico, mas acreditamos que seja importante para as pessoas que forem conhecendo o Catarse aos poucos saberem qual será o estilo de projetos que entrarão no nosso site, qual é a nossa cara.

A gente também olha que tipos de trabalho o dono do projeto já realizou. O ponto é conhecer, ao menos brevemente, o histórico dele e tentar entender se ele é uma pessoa apta a executar aquele projeto caso seja financiado.

Depois disso, a gente vai olhar o projeto em 4 aspectos: vídeo do projeto, descrição, recompensas e valor mínimo. Aqui a gente vai usar nossa experiência em ter acompanhado o que acontece no mundo em termos de crowdfunding nos últimos 10 meses para ajudar as pessoas a mandarem um projeto que tenha uma ótima qualidade e seja atrativo para o público. Caso o projeto não se enquadre no que consideramos como o mínimo aceitável para o Catarse e não se predisponha a realizar as alterações, ele não será postado no site. Na verdade, esse é um processo que usamos com o objetivo de aumentar a chance do projeto ser financiado com sucesso.

Você acredita que é possível o público brasileiro pagar por esse tipo de experiência ou ainda vivemos em um país que as pessoas estão apenas dispostas ao que é de graça?

Tenho certeza de que estão dispostas. O fato de as pessoas que apoiarem os projetos ganharem alguma recompensa, algum mimo, por isso, diminui a barreira para contribuir. Não estamos falando sobre doação, o que talvez seria mais difícil de pegar no Brasil, mas é algo que consideramos estar entre o mecenato e o comércio. Acreditamos que esse ponto é fundamental para o modelo ter sentido no nosso país.



Como vocês veêm o mercado de produção de conteúdo nacional? Projetos como a Catarse são a resposta à uma lei como a Rouanet, que por muitas vezes coloca em xeque a honestidade do sistema???

A gente tem uma crença muito forte de que tem muito projeto bom que ou não se adequa à lei ou não quer enfrentar toda a burocracia. Existem também muitos projetos de pequeno porte que precisam de agilidade e flexibilidade para procurar financiamento. A burocracia é um ponto importante. Se um projeto é enviado para nós e passa pela nossa triagem inicial em todos os pontos, autorizamos ele a entrar no site e começar a levantar o dinheiro em no máximo 2 dias (considerando finais de semana e feriados!).

E, lógico, quanto à honestidade do sistema, a gente acredita que o crowdfunding seja a maneira mais transparente de se financiar um projeto. O criador e seus apoiadores podem ter um diálogo aberto, direto, sem intermediários. Se o criador do projeto não for transparente, dificilmente ele captará aquilo que precisa. É um sistema que premia essas atitudes: honestidade e transparência.

 Um projeto como o de vocês realmente coloca nas mãos da população o poder de escolher o quer consumir no quesito cultura, vocês não se preocupam de alguma maneira com a diminuição da qualidade pelo apelo popularesco que a sociedade brasileira tem quando o assunto é cultura para grandes massas???

Não. Primeiro porque a grande maioria dos projetos é de nicho – e é a rede de relacionamentos existente nesse próprio nicho que apoiará a maior parte do valor que o projeto necessita.
Outro ponto é que a gente acredita que o site é uma grande vitrine dinâmica aonde as pessoas possam conhecer mais trabalhos artísticos diferentes e se interessar por eles. Na verdade, acreditamos no contrário do que propõe a pergunta, acreditamos em um processo de educação executado pelo Catarse onde cada vez mais a cultura será percebida com algo de maior valor.

Quem decide o sistema de recompensas para as pessoas que investem nos projetos e se existe um direcionamento para essas recompensas, feito pelo site, para que o interesse aumente?

As recompensas são decididas pelos próprios criadores do projeto, já que geralmente estão atreladas ao próprio resultado final da execução - que eles conhecem muito mais a fundo que nós. Além disso, podem ser muito pessoais, envolvendo habilidades do próprio criador para retribuir o incentivo de seus apoiadores. Apesar disso, nós ainda ajudamos muito os criadores a pensar não só nas recompensas em si, mas também em como descrevê-las, já que isso é parte fundamental para chamar a atenção das pessoas. Um dos grandes diferenciais desse modelo são as recompensas, não é uma doação é uma troca de valor.

Vocês acreditam que sites como o Catarse serão os futuros catalizadores na distribuição de cultura dentro dos países e aqui no Brasil. É possível que à partir de uma idéia como a de vocês, exista uma discussão de como a cultura deva ser difundida dentro do Brasil, para que todos tenham acesso?

Acreditamos sim, e isso porque o modelo tem tudo a ver com a sociedade que enxergamos para o futuro: colaborativa, interconectada, pautada na economia criativa. Também acreditamos que surgirão plataformas de nicho para permear todas as possibilidades relacionadas à cultura, como por exemplo é a iniciativa do Queremos (www.queremos.com.br), focado em trazer e produzir eventos culturais a partir do financiamento colaborativo.
E não é só possível, como necessário que haja essa discussão sobre a difusão da cultura, mas o momento será um pouco mais pra frente, quando o modelo já tiver um mais bem estabelecido, encorpado, e disseminado na sociedade. Acho que dessa forma a possibilidade de mobilizar e gerar uma mudança será maior.



A Catarse possui alguns projetos interessantíssimos, como por exemplo sobre sustentabilidade feito pela jornalista Natália Garcia. Vocês acreditam que não apenas discos e livros podem ser causadores de grandes mobilizações de crowdfunding, mas também projetos sociais?

Com certeza. Quando a gente fala em projetos criativos, estamos conversando sobre um mundo de possibilidades. Milhares de projetos sociais com ideias fantásticas estão espalhadas pelo Brasil e precisam desse empurrão financeiro. E outra coisa muito importante é que o Catarse, não só como possibilidade de ajudar esses projetos a serem financiados, funciona como uma vitrine para que mais pessoas conheçam e lutem por essas causas.

É possível no futuro um projeto político social ter espaço dentro de uma plataforma de crowdfunding? Algum político já procurou vocês para algo do gênero??

Nenhum político procurou a gente, mas a própria campanha da Marina Silva e, principalmente a do Barack Obama, nos EUA, tiverem forte apoio popular em favor de suas campanhas,
Acho que o crowdfunding é um mecanismo que eles deveriam usar para ajudar, com seu apoio e influência, a solucionar problemas de forma muito mais rápida e organizada.

 Quais os planos para o futuro. O Catarse já pensa em expandir os domínios ou ainda é cedo para pensar nisso???

A gente pensa sim em expandir os domínios, pelo menos a nível de América do Sul, mas não faremos isso antes de atingir um grande público aqui no Brasil. As possibilidades aqui são imensas, é impossível mensurar a quantidade de bons projetos que surgem a cada dia – além daqueles que estão parados só esperando esse empurrãozinho financeiro.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

VALQUíRIA METALOERÓTICA...

Em um mundo de inúmeras sensações extremas, a literatura é fio condutor destas por entre milhares de letras catalisadoras. Guerras, dramas, poesia, sexo, erotismo, amor e qualquer outra parafernália sináptica que abrigue dentro de si, uma coleção de ligações neurológicas que disparam acetilcolinazes de transformação na alma.
 Mas existe algo que não transparece na escalada de sentimentos que os livros despertam. A luta de seu autor para que o trabalho ganhe a visibilidade necessária, para tocar o primal instinto de alguma pessoa. Não basta apenas escrever, necessário uma luta que transporta escritores para uma arena onde não existe pureza de poemas entardecidos ou nuances em nuvens doces. A corrida é selvagem para quem se coloca diante do monstro das editoras. Essas feras capitalistas que muitas vezes preferem o extermínio à reciclagem. A morte precoce ao milagre da vida...
Mas existem valquírias. Mulheres que tomam para si a coragem em um mundo onde, cada vez mais, a emoção e a honestidade parecem frígidas. Munidas apenas de uma força de vontade vulcânica e de talento de sobra para disseminar idéias e bater de frente com o conformismo barato desse dia-a-dia enfadonho. Chantal Dalmass é assim. Guerreira diária contra a vontade de uma editora que queimaria seus livros. Cavalgando por entre arranha-céus, empunhando apenas letras dispostas geometricamente em folhas. Dando livros às pessoas que aceitam serem tocadas pela poesia de seus contos. Uma dádiva em forma de doação que exige calma dos passantes, pois o contrário pode dar margem a interpretações errôneas.
Ser arrebatado por esse tufão de nome Chantal é tão certo quanto o ar respirado.
O GD conversou com essa autora brasileira que luta diariamente contra o monstro editorial.


 Você atualmente distribui livros gratuitamente pelas ruas da capital. Por que você resolveu tomar essa atitude?

CHANTAL DALMASS: Estou distribuindo gratuitamente 3716 exemplares dos livros MENTIRAS E CONFISSÕES, de minha autoria, e A CAMA REDONDA DE MARIA BEATRIZ, de Maria Beatriz Soares, publicados em 2005 pela editora Planeta e que seriam queimados em “operação de destruição de estoque”.
Consegui salvar os livros da fogueira da editora Planeta e agora dou os exemplares nas ruas de São Paulo. Filas de cinema, nas calçadas da rua Augusta, na Barão de Limeira (em frente ao prédio do jornal Folha de São Paulo), na avenida Paulista; já distribuí pessoalmente cerca de 1600 livros.
Dou o exemplar nas mãos do leitor, os livros que seriam queimados estão sendo lidos e passados adiante, os livros estão vivos.
Dou os livros na rua simplesmente porque não consigo viver com a idéia de que uma editora queimar livros seja coisa normal.
A editora queima livros porque é o modo mais simples, rápido e barato de ganhar espaço em seus depósitos e de economizar com transporte, controles, prestação de contas (sobre vendas nulas ou insignificantes) e pagamento de direitos autorais.
Para a editora, doar os livros para bibliotecas e escolas custa dinheiro (frete, etc), vender a preços populares também custa (um funcionário da editora terá de controlar quantidades, estoques e vendas, além de prestar contas e pagar os centavos devidos ao autor).
Queimar é muito mais eficiente!
Dou os livros que salvei da fogueira por duas razões: primeiro, em protesto contra a prática bárbara e abjeta de queimar livros; em segundo lugar, para divulgar o meu trabalho, fazer circular os livros. Que sejam lidos, criticados, que sirvam para passar o tempo, que – com sorte, muita sorte – inspirem alguém.
Espero ainda que os leitores se recusem a comprar de uma editora que queima livros e que trata os autores e sua obra como lixo tóxico.

Como as pessoas recebem essa sua atitude de distribuir livros gratuitamente?

Surpresa, indiferença, risos, raiva, tem de tudo! Em geral, a primeira reação é a incredulidade. Nas ruas, as pessoas desconfiam de mim, não acreditam que é de graça, que estou dando livros novos. E se acreditam, muitos pensam – e dizem – que o livro deve ser uma porcaria, que se fosse bom eu não estaria dando em vez de vender. Ou que nada que é bom vem de graça. Estou acostumada, a reação é natural, não me ofendo e ofereço para o próximo da fila. Muitas vezes a pessoa que recusou muda de idéia e vem pedir um exemplar. Eu dou, agradecida.


 Você acha que as editoras e seu modelo atual de trabalho visam mais o lucro do que a qualidade?

É claro que as editoras visam o lucro, pois são empresas como quaisquer outras, não há nada de mal nisso.
O que é perverso é que a maioria das grandes editoras espera que o livro se venda sozinho, o que acontece no caso de autores famosos ou que têm exposição na mídia. Exemplo recente, o compositor Chico Buarque, que acaba de conquistar o seu terceiro Prêmio Jabuti. O autor é uma estrela, vendas garantidas!
Quando o autor brasileiro não é celebridade, a edição é pequena (3 a 4 mil exemplares) e o esforço de divulgação, praticamente zero. Aí, sem divulgação, o livro não vende mesmo. O livro não vende porque ninguém sabe de sua existência. O livro não vende porque não está fisicamente à venda nas prateleiras das livrarias.
O livro não vende, não vende, não vende.
E ficam os exemplares um tempo lá mofando no depósito da editora. Passados alguns anos eles queimam, e caso encerrado.

Ainda existe muita discussão sobre o advento do iPad e plataformas que comercializam livros digitais. Você acredita que a leitura dos livros físicos (papel) está com seus dias contados?

Não nego que o prazer de ter o livro nas mãos é algo sensual, gosto do cheiro do papel, do toque, de uma capa bacana. Mas acredito que há espaço para todas as formas de leitura e de publicação, não acho que os iBooks e similares ameacem os exemplares de papel.
O que me assusta, sim, e me causa náuseas é aceitar com naturalidade a queima de livros por uma editora.
Um país em que uma empresa que produz e publica livros – uma editora – queima milhares de exemplares novos é um lugar hostil, um pedaço do inferno, um fim de mundo em que coisas terríveis podem acontecer. Impunemente.
  
O conto tem se tornado bem popular na internet. Vários sites dedicados à literatura fornecem espaço para autores. Você acha que o conto é a forma de literatura que melhor se encaixa com o formato virtual?

Textos mais curtos – contos, crônicas, poesias – sem dúvida se adaptam bem ao formato virtual, à exibição na internet.


 Como surgiram as primeiras letras na sua vida? Quem te inspirou pela primeira vez?

Palavras bonitas, rimas cheias de ritmo e música. As Letras surgiram na minha vida através da poesia; ganhei do meu pai um livro de sonetos de Guilherme de Almeida e um outro, um pocket book, de Olavo Bilac. Depois vieram Camões, Castro Alves, Manoel Bandeira. Eu e meu pai líamos juntos, eu acabava decorando os versos, foi assim.
Então descobri a ficção: Monteiro Lobato e Julio Verne. Mitologia era um assunto fascinante. Romances épicos. História. Ficção científica. Biografias. Lia de tudo. Na faculdade – cursei Direito na USP – minhas disciplinas favoritas eram Filosofia do Direito e Direito Romano, com todas aquelas questões passionais envolvendo adultérios, concubinatos e intrigas de família. Algo como o seriado de TV “ROMA” em plena sala de aula, nas Arcadas do Largo de São Francisco.

 Teus contos têm uma imagem forte e visceral, deixando o leitor sentir cada sensação física do que as tuas palavras descrevem. Quando você descobriu seu estilo?

 Não existe “o” momento, a gente vai escrevendo, inventando histórias. E vai mudando também, amadurecendo. Os meus primeiros textos eram mais rebuscados; hoje procuro a simplicidade.



 O que te inspira? De onde vem a força criativa de Chantal?

O que me inspira? Ah, muitas coisas. Observo as pessoas, ouço casos, aumento aqui, invento ali. Ou sonho, fantasio cenas inteiras, penso nos menores detalhes: sons do ambiente, cheiros, cores, roupas, disposição dos móveis, incidentes. Fecho os olhos e crio minhas histórias como se assistisse a um filme. Faço isso na cama, tomando banho, enquanto cozinho ou treinando na academia; só escrevo realmente – no computador ou no papel – depois de ter convivido com os personagens durante dias e dias, ou seja, quando a história já se tornou realidade na minha imaginação.
Escrevo para seduzir, escrevo para provocar e agradar os meus dois amores.
Escrevo por alívio, por raiva, por vingança; às vezes escrevo para matar, gosto de matar! Sou boa com venenos, facas e cartas anônimas.
Escrevo também por tédio, pura falta do que fazer; eu passo mesmo o tempo todo inventando histórias e falando sozinha... Aí escrevo o que imaginei, o texto já sai prontinho.

As fotos do seu site aumentam ainda a sensação de imersão nesse universo criado por você. Cada conto tem uma imagem específica ou a aleatoriedade deve ser preservada?

As fotos publicadas no meu blog http://chantaldalmass.zip.net e no Facebook são auto-retratos feitos com a câmera do celular. Geralmente uso o temporizador automático, 10 segundos (risos). As fotos fazem parte de momentos íntimos, em que estou sozinha, pensando nas histórias, imaginando, fantasiando. Eu arrumo o celular, depois fecho os olhos e me deixo envolver pela sensação do personagem, fica aquele clima... Isso me inspira, mas as imagens são coisas minhas, não têm correspondência direta com os contos.

Existe uma autocobrança sua em relação ao criar?
Não, não me cobro nada.
(Também nem recebo mais nada pelo meu trabalho como ficcionista, foi preciso arrumar outras maneiras de ganhar a vida. Ah, e ignoro o Acordo Ortográfico, jurei que só escrevo idéia e vôo sem acento se me pagarem!)
Quanto a criar, faço isso o tempo todo: imaginar histórias.
E já fazia há muito tempo, antes de sequer pensar em escrever um texto, um conto, uma frase para um concurso de revista.
Vivo em um mundo de fantasia na companhia de amigos, inimigos e desconhecidos imaginários; escrever o que acontece neste lugar e com essas pessoas é uma consequência.



Como você pensa, a partir desse episódio com a editora, comercializar seu trabalho?

No momento, penso apenas em distribuir os 3716 exemplares que salvei da destruição.
Mais tarde decidirei se devo ou não procurar outra editora para a publicação dos meus trabalhos inéditos; só vou publicar se receber da editora um tratamento decente, com divulgação e distribuição apropriadas.
Do contrário, guardarei os textos e as histórias para o meu público restrito, as pessoas especiais quem têm acesso aos meus arquivos e diários privados.


Você acha que a internet, criando esse clima maior de “faça você mesmo” abriu espaço para gente talentosa ou apenas deixou muito mais gente com o espírito "wanna be" de ser aflorado?

Ah, não sei, depende da personalidade, do talento de cada um. De qualquer forma, se a internet servir para incentivar novos escritores, que seja! Esperemos grandes histórias, lindos textos! Esperemos mais e mais leitores também. Mal não faz, não é mesmo?

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O CLUBE LIBERTÁRIO DOS DESCONTENTES



 Tenho e admito vergonhosamente uma certa desconexão com o rock nacional. Os medalhões do gênero eram mais velhos e quando descobria minhas primeiras notas tupiniquins, a banda nos holofotes era o Charlie Brown Jr.. As mais novas não me chamavam a atenção e seguia então sem identificação com meus compatriotas armados de guitarras. 
Chico Science, Planet Hemp e Raimundos não existiam mais (não consigo por mais que tente, desassociar a palavra Raimundos do Rodolfo), e eu sacripanta dotado de um teclado, perigosamente estava começando a permanecer em um limbo cultural atordoante que aumentava ainda mais a minha já famosa ranzinice. Os Superguidis me sacudiram um pouco, mas em uma noite de sábado um batalhão de descontentes arrematou de vez meu ventriculo arterial mais pesado. 
E tudo começou na porta de um bar...


O show era uma das comemorações do aniversário de um clube noturno aqui de São Paulo. A banda tinha um nome que lembrava os grupos dos anos 50 e 60, AURÉLIO E SEUS COMETAS. Mas a diferença era que por alguns minutos eu presenciava pela lateral direita da nicotina cambaleante de meu cigarro, uma cena desconexa da minha noção de banda de rock. 
O vocalista Emir Ruivo ali, lado à lado com todos os que ficavam por alguns minutos esperando o corpo mover-se em direção da porta do clube. Conversando e distribuindo palavras para os passantes de maneira surrealmente real. Não havia ali um pingo sequer de estrelismo fabricado por gestos televisivos ou maniqueísmos de marionetes com cordas de aço dedilhadas.
Era tudo puro e bruto, de uma essência descomunal, por isso mais chamativo de atenção ainda. Pois em um mundo onde todos se conhecem apenas por meio de uma tela, relações tão reais podem confundir o seu descrente ser. 

Mas essa energia de aproximação de elétrons foi desencadeada mais uma vez por uma explosão de corporativismo humanitário, quando o mesmo Emir antes do show convidava e a platéia para aproximar-se do palco. Literalmente de mesa em mesa, novamente deixando os deambulantes que agora repousavam em cadeiras trôpegas sem ação de defesa. Como na letra de Deixa Entrar, o amor pelo calor da platéia sabe o que é melhor para a banda. E assim se fez, mesmo com a casa não tão cheia, a energia que fluia por entre os acordes era palpável em todos os aspectos, fossem eles sensoriais, motores, sexuais e neurológicos. 


Uma banda que entrega-se na mesma maneira que hipnotiza, em toneladas de carisma, rodeada de riffs e batidas que tem intrínsecas ligações com a jovem guarda, o rock inglês e um suingue tipicamente nacional. Pronto, estava eu, poço de bandas alternativas islandesas e canadenses, derrotado em todas as convicções por um trio paulistano quena distorção da guitarra e da noção do que é ou não padrão dentro de uma banda. Xeque mate...
Por isso a primeira entrevista com uma banda nacional aqui do GD tinha que ser com o AURÉLIO E SEUS COMETAS. O que acabou revelando outra grande surpresa...

A banda sai em turnê nacional esse mês de setembro e roda pelas pradarias verde-amarelas durante uma bom tempo. Essa adrenalina da estrada deu um toque especial às respostas, que transbordam a verdade de uma banda que não tem medo de colocar a alma para bater. Como o novo single, lançado essa semana (CORAÇÃO COMETA, que você ouve no meio da entrevista) diz, todo homem tem um coração cometa. E Emir, Mogli Kid e Pedro deixam um rastro de poeira cósmica por onde passam. 
Os trapezistas dos riffs desse clube libertário dos descontentes, falaram assim com o GD:


Como está a vida depois do lançamento de Clube dos Descontentes? Mata-se um leão por dia (ou até mais) quando o assunto é divulgar o trabalho no cenário nacional?

(Emir) A vida está uma maravilha, embora o mercado esteja difícil. O Brasil é problemático. O mercado internacional, de Londres especificamente, é aberto e interessado nos melhores artistas pela razão óbvia: eles serão mais lucrativos que os fracos. Aí aparecem a Lady Gaga, a Amy Winehouse, o Kasabian. Investe-se na diferença. No Brasil, hoje, investe-se na semelhança.

(Mogli) Sim Fábio, a divulgação está nos dando bastante trabalho. O som costuma agradar a quem ouve, mas o resultado ainda não é o que gostaríamos que fosse.

(Pedro Nog) Dá um trabalho do cão fazer uma música bombar, Fábio! Mas em breve, muito breve, breve mesmo, Clube dos Descontentes vai estar bombando no país!

No show do Outs uma coisa já de cara chamou a atenção, Emir indo de mesa em mesa chamando o público pra próximo do palco. Vocês acham que diminuir o espaço entre a banda e o público é primordial? (A banda mostra uma postura muito diferente do messianismo de muita gente que prefere a postura: "olha eu sou o artista e vocês o público, cada um na sua").

(Emir) Eu não acredito em messianismo. Não quero ensinar nada a ninguém. Não sou melhor nem pior que ninguém que esteja ali. Apenas sou o artista, e tenho que me apresentar. Então não vejo porque não dar uma dançadinha com as pessoas, se der vontade.

(Mogli) Quanto mais próximo do palco o público estiver, mais contagiante será a energia. Se torna um ciclo: a energia do palco vai pro público, que volta pro palco. E isso tanto pra energias boas quanto ruins. Então sim, acho primordial diminuir o espaço entre os dois.

(Pedro Nog) O Emirzão é o cara no palco, ele deita! Acho que 50% do valor de um show é a nossa apresentação no palco, e 50% é a resposta do público. Quando o Emir chama o público para participar, o espetáculo fica muito melhor.


Todo mundo já se conhecia muito antes do nascimento de Aurélio e Seus Cometas. E também tocaram com outras bandas (Emir tocou em uma banda de reggae, Ruba Dub, Mogli no Xorumi tal e etc). O que veio na bagagem desses tempos? Existe alguma coisa dos tempos de Song Festival do colégio na banda?

(Emir) O Song Festival me deu a noção de merecimento. Lá, eu ganhei minhas bolsas no Alumni, que me permitiram e me deram um bom inglês. Sabia que eu precisaria me esforçar para ganhar. Infelizmente o macrocosmos brasileiro não me entendeu como o microcosmos da escola.

(Mogli) Dos tempos de amizade veio o entrosamento na convivência, já que conheço o Pedro desde o jardim e já estava bastante acostumado com a presença do Emir, pois ia muito à casa deles. Musicalmente falando a formação da banda não podia ser melhor pra mim, porque aprendi a tocar nas jam's que fazíamos no sítio da família deles. Quanto ao Xorumi, apesar de ter existido por pouco tempo, foi muito divertido e importante já que foi a minha primeira experiência com uma banda. Chegamos a nos apresentar em alguns lugares, mas dificuldade com o entrosamento era muito grande, e acabamos nos separando

(Pedro Nog) O que veio para mim foi o medo de palco. Nunca toquei profissionalmente antes dos Aurélios. Quando fiz meu primeiro show, na bateria, com uns 10 anos, para um ginásio lotado de gente, chorei porque não queria entrar no palco. No primeiro show com os Aurélios, já com 21 anos, tremi como um prisioneiro de guerra. Mas agora acostumei e fico tranquilo nos shows. Thx God

E por falar em sons antigos, tem muito do rock das décadas passadas no som do Aurélio. Como as influências entram na hora da composição? Chegam naturalmente ou existem momentos em que um olha pro outro e diz: vamos tentar algo na linha daquela banda.

(Emir) Quase sempre eles vêm naturalmente. Teve uma ou duas vezes, durante o processo de gravação, que eu disse a eles "olha, vamos tentar isso aqui" e mostrava uma referência. Mas isso é só para resolver problemas.

(Mogli) Em relação as composições, a única que fizemos juntos foi "Rock 'n' Roll" que saiu de uma jam, então ela demonstra bem a característica natural do nosso som, nesse momento. As outras são composições do Emir, mas que foram arranjadas pelos três. Muitas vezes, como a bateria foi o primeiro instrumento a ser gravado, o Emir tocava e falava: "Vai Sievers, acompanha". E esse era o primeiro passo pra arranjar a música. E outras tantas vezes ele já vinha com a pegada na cabeça.

(Pedro Nog) Nossos arranjos são bem naturais. Normalmente, no primeiro ensaio já sai o produto final.

De onde veio a idéia dos hu-hás no refrão de Deixa Entrar? Aliás, uma música que definitivamente hit certeiro em qualquer lugar do mundo. O título Back On The Chain Gang e a palavra Pretenders é a origem dessa traquinagem no refrão?

(Emir) Eheh. Sim, nós roubamos de Back On The Chain Gang.

(Mogli) O que você acha? hehehe

(Pedro Nog) Bons artistas roubam, maus artista copiam. Pode dizer na entrevista que essa frase é minha.


Esse segundo semestre de 2010 está marcado com talvez a maior quantidade de shows internacionais no Brasil. E ao mesmo tempo que acontece essa enxurrada, reuniões sobre o futuro dos festivais e o papel das bandas e organizadores mantém os nervos meio exaltados. Existe ainda aquela história de que é muito mais fácil uma banda de fora ter espaço pra tocar do que uma nacional?

(Emir) Não tenha dúvida. Mas é culpa nossa. Não adianta chorar. 
Eles são mais competentes. Fazem tudo melhor, do som à publicidade. Se você tem grandes artistas no país, você consegue competir. Mas os medianos tomaram o Brasil. 

Essas pessoas que você citou, das reuniões, são oportunistas despreparadas e arrogantes. Acho uma piada esse comunismo artístico que esse pessoal propõe. Numa dessas reuniões, eu ouvi o Miranda, que foi um grande produtor, mas não entende nada da área executiva, dizer, num tom de super elogio, que o pessoal dos Móveis Coloniais são "super organizadinhos" (nota do GD: eu assisti via internet essa reunião realizada no Studio SP, e o Miranda fala exatamente essa frase). 

Música, arte, não é para ser organizadinha. Isso não é argumento artístico. É o mesmo que dizer que um jogador de futebol é bonito. Se ele não jogar, não adianta nada. Você ja imaginou o Brian Jones apresentando o Jimi Hendrix em Woodstock dizendo "olha, eis aqui um guitarrista que eu ouvi, é super organizadinho".
Quando esse tipo de valor começa a se sobressair, você nota o quanto está doente o mercado. E aí, qual chance você tem de fazer frente à um mercado que presa, genuinamente, pelo brilho? Brilhantes versus organizadinhos. Que chance a gente tem?

(Mogli) Depende da proposta do evento. Se for uma coisa de grande porte com certeza eles vão buscar artistas internacionais porque chama mais atenção e obviamente pela qualidade musical. Existem coisas interessantísimas no Brasil, mas ainda andam meio escondidos de uma forma geral. A divulgação que prima únicamente a qualidade musical e a que tenha espaço para novos artistas brasileros, não é líder de audiência. Isso dificulta muito pra que um artista nacional possa disputar um espaço com Rage Against, Killers, Scissor Sisters, e etc...

(Pedro Nog) Acho natural isso. O Brasil tem muitos bons artistas, mas -- acredito eu -- a Inglaterra e os Estados Unidos ainda criam a melhor música do mundo. Por isso eles têm tanto espaço aqui e em qualquer lugar onde forem tocar.

Um dos festivais é o SWU. Estão acontecendo seletivas (batalhas de bandas no estillo Escola do Rock), para músicos nacionais poderem participar do line up. Vocês acham que esse esquema de mini festival da Record bizarro funciona? Vocês foram procurados pelos festivais ou pelos organizadores das seletivas?

(Emir) Nós não fomos procurados por ninguém. O único festival que nos procurou foi o Release Alternativo de Goiânia. 
Esse tipo de seletiva via internet/telefone só pode funcionar no Brasil numa escala muito grande (como o Big Brother, por exemplo). 

Aqui nós não temos essa cultura de gostar dessas coisas. Em Londres, eles gostam. O país inteiro acompanha o Britain's Got Talent. No Brasil, quem assiste o Ídolos? Aí a coisa fica mais embaixo: quem vota na seletiva do SWU? Os amigos dos artistas. E quem ganha? Quem tem mais amigos com paciência para votar. Então, acho que no Brasil isso não funciona.
O que poderia ser interessante, eu acredito, seria fazer um crivo especializado e um popular e cada um valer uma certa quantidade de votos. Aí acho que poderia ser mais próximo do justo.

(Mogli) Acho que depende do que o evento se propõe a realizar. Se o objetivo for apresentar bandas novas creio possa funcionar como um último estágio de seleção.

(Pedro Nog) Sou viciado em jogos, então adoro a ideia de festivais com seletiva. Quem sabe na próxima não estaremos lá?



Desde que eu escutei a primeira nota de música, ouvia sobre a briga das pessoas que defendiam o rock nacional contra o rock gringo. Hoje essa briga parece ter voltado para os que gostam do rock nacional independente e o que faz sucesso em canais de tv ou as bandas de emocore colorido. Essa regurgitação californiana do punk colorido atrapalha ou ajuda separar quem é bom de que não é?

(Emir) Eu acho que essa briga não ajuda, porque é briga de torcedor. É parecido com o que eu falei antes, o que tem que importar é a qualidade e não se ele é do time do indie ou colorido. Se a gente conseguisse ter a decência de ser a gente mesmo, seria um bem para a humanidade.

(Mogli) Para as fãs do Restart eles são bons, para muitos eles não são bons. Elas gostam deles, muitos não gostam deles. Acho que ninguém ousaria dizer que Beethoven não é bom. Mas alguns gostam e outros não. Acho que o que importa no fundo é se o que a pessoa faz lhe traz prazer, sendo boa ou não. Pra quem gosta de apreciar, sempre vai ter coisa boa.

(Pedro Nog) Num país com 190 milhões de pessoas, existe público para qualquer tipo de música. Os canais de TV, as estações de rádios e os sites da internet são milhares -- então ninguém precisa ouvir o que não gosta. Não há motivo para ficar brigando.

Sempre pergunto para as bandas gringas como é a relação delas com a distribuição de música gratuita na internet. Todos se mostraram a favor. Qual a posição da banda quanto a isso? Música de graça deprecia o trabalho?

(Emir) Se essa for a tendência, não me importo. Eu, pessoalmente, não sou a favor.
Não que deprecie o trabalho, afinal a música é de graça na TV, no rádio, e todo mundo briga para estar ali. Acho apenas que existe uma roda muito grande dentro da música profissional, que inclui compositores, produtores. Principalmente esses dois ganham na venda. Se não houvesse venda, por exemplo, eu não poderia ter gravado O Barquinho nem Só O Ôme. Eu acho que seria uma grande perda para mim.

(nota do GD2: O Barquinho, a regravação do clássico do cancioneiro brasileiro escrita por Roberto Menescal e Ronaldo Boscoli e já cantada pela riot girrll original brasileira Maysa, está no primeiro disco da banda A História de Aurélio e Seus Cometas Parte 1-A Ascenção, lançado em 2006. O disco é quase uma ópera rock que conta a história de Aurélio para formar uma banda. E Só O Ôme, do sambista Noriel Vilela, está no mais recente trabalho, O Clube Dos Descontentes)

(Mogli) Dinheiro é consequência, música tem que ser ouvida por quem pode e por quem não pode pagar. Eu sou a favor.

(Pedro Nog) Acho que a internet ajuda a divulgar a música e a banda. Depois, dá para fazer dinheiro com os shows. Sou a favor, também.

Aliás sobre isso existe um projeto que preconiza o pagamento de uma taxa pelo usuário para ter acesso ao que quiser. É uma saída viável?

(Emir) Não sabia disso. É uma idéia justa, mas acho difícil controlar. Se for possível, sou favorável.

(Mogli) Eu gosto da idéia da música ser liberada pra quem quiser ouvir sem pagar, e sou a favor dela.

(Pedro Nog) Não conhecia o projeto, também. Mas parece legal.

 Existem canções com letras cheias de picardias como por exemplo De Segunda à Segunda, outras vezes muito mais introspectivas como em A Tela , que é um poema musicado. É preciso estar mais "cafajeste" no bom sentido pra escrever as letras mais sarcásticas e mais "feeling blues" para as canções mais densas?

(Emir) Eu acho que as mais sacanas não são menos densas necessariamente, mas sim, em geral é isso.

(Pedro Nog) Sem dúvida. Depois de terminar um namoro de 3 anos, você quer escrever Tela; depois de pegar 2 gatas no mesmo fim-de-semana, você quer escrever Deixe Entrar o Amor.

Como foi trabalhar com Paul Waller (arranjador que já trabalhou com Björk, Seal, entre outros)

(Emir) O Paul Waller é um dos grandes arranjadores do Reino Unido. Ele me ensinou a ter um olhar diferente diante da música profissional. Além disso, é um cara simples e humilde, amigo dos alunos. A nossa sala era de alto nível, de forma que muito das aulas, talvez metade, eram bate-papos. E só de estar ali onde a tendência é criada, e não onde se segue como estamos acostumados, é outra coisa.

Emir também pinta, onde as cores entram na canção?

(Emir) Eu pinto telas em tinta acrílica. Não tenho paciência para esperar a tinta a óleo secar, e nem tenho o cuidado que é necessário para aquarelas. Sobre a convergência das duas artes, acho que está na motivação. É sempre a mesma, vem da observação e da vontade de contar uma história. Aí tem histórias que são mais fáceis de contar com palavras e melodias, outras com desenhos.

Próximo disco, ainda é cedo ou já surgram idéias?

(Emir) Já temos a idéia, mas ela obviamente pode mudar. Mas comercialmente, a gente precisa respeitar uma ordem. Ainda leva pelo menos um ano para sair o próximo.

(Pedro Nog) Ainda precisamos vender mais cópias do Clube dos Descontentes! Mas já temos material para dois álbuns depois disso.




Quais são os artistas nacionais e os gringos que influenciam cada um de vocês. Obviamente existem as influências, mas quem fala mais fundo??


(Emir) Eu realmente não gostaria de fazer essa lista, porque ela seria tão longa que vc não tem idéia. Mas vai de Beatles, Stones, Beach Boys a Roberta Miranda, Cauby Peixoto, Gilberto Gil, Mutantes passando por Smashing Pumpkins, Elvis Costello, Bowie, Dylan, Arnaldo, Tom Jobim, Menor do Chapa, Tati Quebra Barraco, Michael Jackson, Madonna. E vai muito, muito mais longe.

(Pedro) As influências são muitos, mas as principais são Beatles, Stones, Who e David Bowie.

(Mogli) Beatles, Killers, Abba, Strokes, Raulzito, Legião Urbana, Los Hermanos.

 Junto com as discussões realizadas à respeito do funcionamento dos festivais, ainda aqui no Brasil existe a relação ruim com o ECAD. O músico João Parahyba inclusive postou uma carta aberta em um site (Scream & Yell do jornalilsta Marcelo Costa) sobre isso. Qual é a posição de vocês sobre isso? O ECAD mais atrapalha ou ajuda? Existem possíveis mudanças que poderiam melhorar essa relação?

(Pedro) Não tenho muito conhecimento sobre a indústria da música, o Emir é mais preparado para responder isso.

(Emir) Eu não tenho nenhum problema com o ECAD. Eles sempre me pagaram direitinho, nunca me cobraram abusivamente. Meu problema é com o Ministério da Cultura, porque eu não acredito que esse sistema de subsídios é justo, nem acho que é bom para a cultura, pois não valoriza a qualidade. Investimento inteligente é diminuir impostos para produtos artísticos, como instrumentos, equipamentos, empresas produtoras de eventos.

(Mogli) Nunca tivemos problemas com o ECAD.

A banda vai sair em turnê essa semana. Vocês vão passar por onde? Tocar fora do país é algo que é objetivo do Aurélio e Seus Cometas?

(Emir) Não necessariamente, embora aceitaria um convite. Eu não faço questão de tocar fora só pra impressionar o mercado brasileiro. Quero que se dane. Se a música for um sucesso em Portugal, toco em Portugal. Mas prefiro não tocar em Portugal para ninguém só pra dizer que toquei em Portugal.

(Mogli) Passaremos por Porto Alegre, Caxias, Londrina, Maringá, Florianópolis, Curitiba. Tocar fora do país me interessa particularmente, mas é um passo pra ser dado mais adiante.

(Pedro) O Emir tem o roteiro. Sem dúvida tocar no exterior é um sonho!



A quantidade de bandas cantando em inglês sempre foi razoável dentro do cenário, mas parece que esse número em dois anos aumentou. Vocês já cogitaram a possibilidade de mudar o idioma das letras? É realmente mais fácil compor em inglês, ou quem sabe escreve até em mandarim?

(Emir) Risos. Mandarim seria o máximo. Olha, eu tenho uma visão jungiana sobre composições em inglês ou em uma língua que não seja a sua: compositores inseguros. Quando o compositor tem, de alguma forma, vergonha do que ele vai dizer, ele prefere que não seja entendido. Tem uma amiga minha que compõe em francês e inglês. Uma vez eu perguntei porque ela compunha nessas línguas. Ela disse que em português tudo o que você fala soa brega. Não é verdade. O que ela fala é brega, em francês, inglês ou português. A única diferença é que a breguice não é compreendida e isso é um acalento para quem tem medo de se expôr. Mas quem não quer se expôr não pode ser artista. Quem não quer pintar o rosto não pode ser palhaço.

(Pedro) O inglês é uma língua muito sonora, qualquer coisa fica boa para cantar. Nós pensamos, sim, em gravar algumas coisas em inglês mas para lançar fora do Brasil. Aqui dentro, vamos de português, mesmo.

(Mogli) Quando componho é tudo em português, até porque meu inglês não é dos melhores. Não tenho problemas com artistas brasileiros compondo em outra língua, mas como não é a língua natural as vezes fica uma coisa meio forçada. 


(nota do GD3: eu acho que "deixa entrar o amor" para o refrão é muito mais sonoro e poético que "let the love come in", no contexto da canção citada)
   
Minha timeline no twitter sempre tem algum mini post de fãs de vocês. Como é a relação com os eles? Eles estão aumentando em número (essa é a impressão que eu tenho) e tornando-se cada vez mais ativos. Manter a vida on line da banda ativa ajuda ou é algo que não faz diferença?

(Emir) Que legal! Olha, eu acho que a relação com os fãs é importante, essa proximidade é legal. Mas na verdade quem cuida do Twitter é nosso produtor,  eu respondo algumas coisas pessoalmente, então não sei te dar nenhum dado sobre isso.

(Pedro) Estamos trabalhando duro para divulgar a banda, e cada vez mais pessoas estão curtindo nosso som. Hoje em dia, a internet é fundamental para qualquer nova banda.

(Mogli) Ajuda muito. Faz com que os fãs se mantenham interessados, além do prazer de poder falar com as pessoas que criam aquele trabalho que você tanto admira. Também é uma forma de feedback que nós temos.



Depois de mudar-me para São Paulo (há seis anos), pude acompanhar de perto os shows de bandas nacionais. Sempre vejo-as lutando pra coseguir levar uma quantidade de pessoas que muitas vezes é reduzida. Inclusive com bandas que são mais famosas, o público é pequeno e nem está lá por causa do show. Eu me lembro de assistir à um show do Rafael Castro em um casa da Vila Madalena onde era como se fosse uma festa particular, em relação à quantidade de pessoas. O que falta para lotar-se casas noturnas? Falta divulgação ou existe pouca mobilização para que a cena de bandas cresça mais?

(Emir) Acho que isso é um fenômeno mundial nas grandes cidades. Meu amigo assistiu o Mick Taylor em Londres que, olha só, foi guitarrista dos Stones, num clube com 100 pessoas. Isso, obviamente, não vai acontecer em Brighton, como não aconteceria no Guarujá, onde tem menos eventos competindo. É que em São Paulo, você vai ter no mesmo dia o Cauby Peixoto, o Sérgio Reis, o Jairzinho, a Céu, o Sepultura, o Aurélio e Seus Cometas.

(Pedro) São Paulo é como uma selva: sempre que você fizer um show, vai haver 10, ou 15, ou 20 bandas fazendo no mesmo dia. Então não é fácil lotar uma casa.

 (Mogli) Essa é uma questão realmente muito interessante. O que eu posso dizer sobre esse assunto é em relação a nossa banda. Na metade de 2008 nós estavamos fazendo shows com bastante freqüência, e assim fomos conquistandos um “certo público”. Nessa época em um show com pouca divulgação, onde a atração era apenas nossa banda, iam 150 pessoas. Estavamos sempre sendo cobrados por shows. Mas acontece que em 2009 nós ficamos parados devido a viagem do Emir e do Pedro para a Inglaterra. Com isso nós perdemos uma grande parcela desse público. Resumindo, acho que a divulgação é essencial, mas se manter tocando também.

Sobre isso eu li uma entrevista do Daniel Belleza dizendo que é sempre assim, os shows não tem mais público, mas sempre que uma pessoa estiver pulando ele toca e com toda a força possível. É assim com vocês?

(Emir) É por aí. Para mim não precisa estar pulando. Se tiver uma pessoa que saiu de casa para me ver, acredito que ela tem direito de ficar sentada se quiser, eu vou tocar do mesmo jeito que toquei em Salvador para 500 mil pessoas.

(Mogli) Você tocar para poucas pessoas é um pouco frustrante na hora que você entra pra começar o show. Mas depois que começa acaba sendo no mínimo legal, e dependedo da energira das pessoas que ali estiverem pode se tornar algo extremamente agradável. Com certeza é muito mais interessante você tocar para 15 pessoas que curtem muito o show, do que para 100 que não curtem. Pelo jeito o Daniel também concorda com isso, (risos).....

(Pedro) Sem dúvida: mesmo que o show seja para uma pessoa, tentamos tocar o nosso melhor. Mas não é fácil manter a empolgação numa casa vazia... 

 Clube dos Descontentes apesar de todo o funk, soul e power pop, tem uma letra que é puro punk. De onde surgiu a idéia? Estava todo mundo muito puto com alguma coisa?

(Mogli) Isso ai é com o Ruivo...hahaha

(Pedro) A letra é do Emir, acho melhor ele contar.

(Emir) Eu estava. Foi uma má tarde que criou o primeiro verso e o refrão. O resto foi trabalhado.

 Uma última observação:

Quando procurava as fotos para ilustrar a entrevista, sempre esbarrava nessas postadas. Mas nunca sabia quem era a autora das mesmas. E olha que elas estão espalhadas por muitos lugares. 
Acabei descobrindo que elas são de autoria de uma talentosa menina que se chama LÍVIA RAMIREZ. E vendo seu trabalho no flickr (os links logo abaixo), descobri que já estivemos no mesmo show da Livraria da Esquina. Então está aí o crédito das fotos para ela.

Os lugares onde você pode achar o trabalho de Lívia são:


http://cargocollective.com/liviaramirez

http://hifrank-hifrank.blogspot.com/

http://www.flickr.com/people/liviaramirez/

sexta-feira, 28 de maio de 2010

DE ALMA ABERTA


Conversar com bandas é uma faca sempre de oito gumes. Muitas vezes a espera de tempo faz a ansiedade ser ruminada dentro de pequenas notas de desespero velado. Outras a sensação de que alguma coisa que você fez está completamente equivocada é tão iminente que chega a ser palpável, uma chaga aberta dentro de seu peito. Não existe uma lógica, muito menos uma receita amplificada que funcione de A até o Z.
O que torna tudo muito mais divertido, afinal de contas conversas provêm de bocas infinitas e cheias de espírito e isso, além de transformar fonética em idéias, faz de qualquer ouvinte ou locutor algo muito maior. E isso quem lhes escreve é alguém que não possui quase nenhum traquejo social.
Mas quando as contrações dentro de um universo em expansão (que diminui seus espaços territoriais a cada dia) se igualam, um encontro pode proporcionar as melhores sensações possíveis. Essa tônica foi constante durante todo o processo da entrevista com a banda do Texas, FATE LIONS. Os meninos americanos cheios de poesia e acordes que são de beleza ímpar proporcionaram toneladas de coisas boas. E a impressão que se tem quando as respostas chegaram é de que já conhecíamos a banda a milhares de anos. Tanto assim que se você perguntar para esse sacripanta escritor quando eu ouvi a banda pela primeira vez, eu não saberei responder. Pois as canções do Fate Lions parecem ter nascido comigo, simplesmente estavam lá. Acordes aguardando serem descobertos para recobrirem seu peito com calma e beleza, e vamos e venhamos não é necessário mais nada.
Nessas linhas além da aula sobre rock proporcionada pelo guitarrista e vocalista Jason Manriquez, você vai poder entender o significado da palavra real. Uma paixão pela música e coerência em saber exatamente qual o papel da banda em um mundo que está ficando cada vez menor, tudo isso sem um pingo de egolatria. Uma banda que faz seu caminho e abre entrecantos dentro de um universo globalizado. Enquanto muita gente luta por um holofote mais forte, os Fate Lions estão aí com uma alma e coração cheios de notas musicais. Aliás, os nossos grandes produtores de shows iriam acertar em cheio trazendo a banda para o Brasil, afinal de contas não é sempre que uma entrevista é cheia de respostas brilhantes e com um senso irreparável de alma.......

Toda vez que eu vejo suas mensagens no Twitter, a primeira coisa que eu penso é que vocês gostam do bom rock and roll. Bandas como The Replacements, Alex Chilton, Yo La Tengo, Big Star e outras sempre aparece nas suas mensagens. Como elas influenciaram seu som?

Sim, em todos os aspectos.
Niki (Niki Saukam, guitarrista) e eu começamos a tocar juntos, em parte por causa de nossa admiração pelo Big Star. Paul Westerberg e The Replacements, Teenage Fanclub, The Posies, Superdrag, Trash Can Sinatras são influências e todos têm defendido Big Star em algum grau. Então, realmente com exceção dos Beatles eu não posso pensar em qualquer outra banda além do Big Star que teve uma influência tão profunda. The Smiths também foram muito importantes. Para muitas pessoas ao atravessar a adolescência, The Smiths e Morrissey são uma espécie de revelação. Um profundo sentido de descobrir algum segredo do mundo que você pode reivindicar a adesão.
Como alguém pode resistir ao jogo de palavras e bravatas? O melodrama na fronteira com o acampamento. É realmente o pacote completo.
Perfeito quando você adentra no estilo de guitarra incrível de Johnny Marr.

Yo La Tengo
, eu descobri mais tarde.
Eles eram como o Sonic Youth para mim. Míticos...
Eu sempre tinha ouvido falar deles por diferentes pessoas.
Pessoas que eu admirava e a música não me decepcionou.
Todas estas bandas tinham estilos muito diferentes e formas de apresentação singulares. As estruturas variadas e canções soavam diferentes, mas a sua vibração tinha um clima que ressoava no tecido conjuntivo entre a mente e o coração. Dessa forma, eles sempre representaram uma frente unida no meu pensamento com sua música.
Lembro-me de ser uma criança muito jovem e ouvir a coleção de discos dos meus pais. The Carpenters realmente ficou preso dentro da minha cabeça. Aos cinco anos de idade eu já estava tentando entender um mundo de saudade e mágoa. Não sentir como se encaixam mesmo tendo tanto, me deixava perdido e vazio. Mas ainda assim com toda a tristeza, havia essa condução e desejo incontornável para encontrar algo de bom e bonito. Então, nossas influências clássicas realmente empurraram-nos para tentar recapturar o sentimento que temos quando ouvimos à eles. Eu acho que nós nunca imaginamos que poderíamos nos aproximar do nível de habilidade ou talento dessas bandas. É apenas um esforço para capturar algo parecido com o humor que eles compartilhavam em sua própria música e tentar passar isso para alguém disposto a ouvir a nossa música.

Ainda sobre o Twitter.
A conta de vocês no site é bem ativa. Vocês estão sempre postando algo sobre a banda ou sobre outras pessoas. Você acredita que o futuro da música (como forma de arte ou de negócios) está na internet?

Não só o futuro da música está profundamente entrelaçado com a internet de muitas formas, mas na verdade o presente, o agora da música está sendo sustentado por ela. Todas as músicas produzidas hoje que mais importam para mim, são propagadas pela web.
Como um artista poderia ter sua música apreciada por pessoas tão distantes fisicamente???
É realmente surpreendente.
Como tudo que explode em vida e se desenvolve em um ritmo tão rápido, há uma série de inconvenientes e problemas. Há um número ainda maior de bandas e artistas lutando para serem ouvidas pelo mesmo pool de ouvintes. Mas, na minha opinião, é assim que vale à pena. Criar alguma coisa em música tem muito com fazer chegar às pessoas. Se não for compartilhado, é como uma pequena chama que rapidamente irá extinguir-se da existência. Mas quando você divide com outros, eles tem a oportunidade de acender um fogo muito maior. Uma chama que vai continuar enquanto ele é compartilhado. A internet faz com que certamente isso fique mais fácil. As imagens são muito agradáveis.


Como você vê o download gratuito de música na web. Ele mata ou eleva espíritos com os sons novos?

Essa é uma pergunta complicada. Para muitos artistas ainda é uma luta chegar a um acordo quando o assunto é oferecer suas músicas. Realmente isso já está acontecendo, mesmo que eles não queiram aceitar.
A
s vezes é porque eles se agarram ao ideal. Que sua música deveria ser um empreendimento auto-sustentável. Isso é grandioso. Isso ainda acontece em certa medida, para muitas pessoas. Mas a idéia de que você pode ser um rock star, vender discos e dar-se ao luxo de viver uma vida rica é uma mentira.
Não vale nem a pena perseguir esse propósito. O verdadeiro objetivo deve ser o dom da vida eterna através de sua música. Eu quero viver para sempre nos corações das pessoas que se conectam com a minha música.
Espero poder ver alguma parte deste presente antes de eu deixar esta vida. Em muitos aspectos, eu comecei a sentir os benefícios dessa experiência coletiva. Assim, com este objetivo firme em minha mente eu fico muito confortável em oferecer downloads ou qualquer outra coisa para as pessoas. Especialmente as que poderiam não ter outra maneira de ouvir a música.
Por que não ia querer que eles não tivessem?
Estou muito lisonjeado por ver que as pessoas tomam seu tempo para nos ver. Ainda mais quando eles compartilham-nos com os seus amigos e amantes.

Muitos pais gostam da nossa música também e isso é muito bom.




Quando vocês se conheceram e como foi o começo da banda?

Fate Lions começou porque eu tinha algumas idéias de músicas, principalmente um monte de letras e um desejo de sair e tocar para as pessoas. Eu queria ter a diversão que eu estava vendo outras bandas. Queria contato com as pessoas em um nível de espiritualidade quase tribal e fazer o rock and roll acontecer. No início havia um ruído muito forte e tocávamos os instrumentos desnecessariamente alto.
Mas finalmente começamos a encontrar um ritmo.
Niki e eu somos os únicos dois Fate Lions originais ainda no grupo. Eu vou continuar fazendo isso enquanto eu puder ou até Niki decidir que ele precisa fazer outra coisa.
Depois disso vou começar outra banda e encontrar novas maneiras de me conectar. Fazer música para todas as coisas tolas que as pessoas em minhas músicas dizem e fazem. A banda começou através de um par de xícaras de café. Niki foi baterista em uma banda shoegaze chamada Snowdonnas. Eu sabia que ele tocava guitarra e incitei a idéia dele tentar escrever canções como Big Star e Guided By Voices, outra influência compartilhada. O nosso atual baterista, Josh Hoover estava com uma banda chamada The Chemistry Set, quando o convidei para tocar bateria no disco quando fomos para o estúdio. Que gradualmente se transformou em nossa formação nos shows.
Nosso baixista, Tony Ferraro, tinha sua própria banda chamada Eaton Lake Tonics. Ele perguntou se poderia tocar baixo com a gente. Ele já era um dos meus favoritos artistas locais e estava muito animado com a idéia dele estar na banda. O nosso membro mais recente é Drew Gabbert. Ele é um talentoso multi-instrumentista.
Nossos shows agora são muito energéticos e cheios de vida, assim que as estrelas alinharam-se.


Em uma cena no filme dos Ramones (End Of The Century), Legs McNeil diz que todas as canções deles são puro pop americano. E em todas as músicas de Fate Lions, há uma forte impressão de rock americano poderoso. Vocês se consideram uma banda americana de rock clássica, indie rockers, power pop, ou não há adjetivo para a música?

Qualquer tipo de rótulo, em última análise, derrota. Faz você imediatamente atraente para um grupo, enquanto ao mesmo tempo alienante para outra que possa amar a sua música.
Mas os rótulos são muito necessários, especialmente na internet onde você tem que se definir por gênero em partes para encaixar a sua música em sites como MySpace e Facebook. Eu sempre achei difícil escolher apenas uma definição. Em muitos aspectos, somos todas as coisas que você descreve na sua pergunta.
Mas também muito diferentes. E realmente eu estou bem confortável com isso. Porque eu sei que o que sai é real e genuíno.
Eu quero ser rock, mas eu só posso ser eu. Estamos ficando mais velhos e nossas influências são um acúmulo contínuo de experiências musicais e isso nos faz rock clássico. Quem não ama os Stones?
Somos indie do ponto de vista de nosso comportamento de prático e auto-suficiente. Eu não uso jeans apertado ou qualquer coisa tão assim que colocaria a banda na moda indie, como é entendido por muitos. Power pop é um apelido muito divertido e nós muitas vezes usamos para descrever o nosso som em geral. É mais inocente e menos abertamente macho do que simplesmente rock and roll.
Mas não estamos exatamente saltitando de alegria o suficiente para manter uma adesão estrita ao clube power pop.

Quem são suas bandas favoritas hoje em dia?

Estou apaixonado por Besnard Lakes agora.
Seu mais recente álbum é incrível e eu os vi aqui em Dallas,
fiquei encantado. The Flaming Lips é uma banda incrível, tanto musicalmente e como pessoas.
Eu realmente gostei do The National. Qualquer coisa Dan Bejar faz é ouro em minha mente.
Spoon, The Whigs, School of Seven Bells e RTB2. Deertick tem um som ótimo, como os M's. Jens Lekman e Deerhoof.
Eu acho que os The Antlers têm algumas das maiores letras.
Belle and Sebastian.
Quasi é uma banda grande.
Estou realmente gostando muito de Dean Wareham e todos os projetos que ele faz parte.
Ahh e a lista continua e continua......
Eu tenho certeza que estou esquecendo um monte de gente. Eu nunca sei quem será o próximo. Essa é outra grande vantagem sobre a internet. Descobrir o que as pessoas estão falando e verificar por mim mesmo se essa música é para mim ou não. Eu também gosto muito de gravações antigas, alguns dos artistas e performers que já não estão conosco. Pessoas como Townes Van Zandt, Patsy Cline, Skeeter Davis. Eu também gosto do estilo suave de Françoise Hardy.




Existem muitas cores belas em canções como Our Song e Shinning Places, por exemplo. Como se essas músicas são capazes de tirar sorrisos de pessoas com raiva, mesmo que as letras sejam fortes. Há uma necessidade de estar feliz para escrever canções como essas e de mau humor para fazer uma música triste? Como isso funciona?

Já ouvi falar de compositores que estão completamente no clima da música quando a escrevem. Isso parece uma perspectiva muito interessante e igualmente assustadora para mim. Como todos nós eu fui tocado pela tristeza e momentos de depressão intensa.
Mas mais do que sentir a impotência de não poder ajudar um amigo ou um ente querido quando eles estavam se sentindo desesperados. Então, para mim é um processo muito mais compreensivo. Quando eu estou bravo ou triste, estou muito ocupado tentando mudar o que está errado ou consertar o que está quebrado e posso não ter a oportunidade de sentar e escrever. Mas é na tentativa de me entender e aos outros, assim como através da observação e da reflexão que eu tenho o que costumo chamar de material-origem para as canções.
Então é sempre uma luta sobre como colocar no papel tudo isso. Você sempre quer que as palavras soem bem juntas. Elas precisam aumentar a qualidade musical da canção e melodia, mas também para evocar a imaginação e o humor que eu quero comunicar. Alguns dos meus compositores favoritos fazem isso parecer tão fácil.
Mas acho que todos trabalharam duro na canção em algum ponto durante a composição. Costumo gastar muito tempo pensando em como deliberada e evidente uma letra tem de ser.

-Será que é só eu chegar e dizer exatamente o que eu quero dizer?
-Devo ser mais direto?

Com sentimentos mais difíceis e quando as emoções são muito pessoais, é mais fácil ser mais enigmático e simbólico. Isso pode ser defensivo quando estou prestes a compartilhar algo muito pessoal com uma sala cheia de pessoas que podem pensar que eu sou a desculpa mais ridícula para um ser humano que já viram.
Mas, se eu posso retirar esse conflito da equação, bom, isso é muito estimulante. Estou constantemente lembrando o fato de que uma vez que a canção é escrita, e outras pessoas a possuem, a música e seu significado mais profundo é agora único para cada pessoa.
A canção de Dylan "Belongs to Me" significa algo para mim que é completamente separada e distinta do que poderia significar para você ou até mesmo próprio Dylan. Eu imagino que seja como uma refeição ou mesmo uma pintura. Nós podemos concordar com aquilo que acho que todos estão vendo e experimentando, os sabores e cores. Mas realmente só podemos ter certeza de que nós mesmos estamos experimentando. Mesmo que certeza pessoal é por vezes discutível. Acho que é mais fácil escrever com um pequeno começo de melodia já em minha cabeça. O fluxo de palavras e imagens e quão bem elas aderem ou alteraram-se a partir da melodia, é que ditam tudo.
Se em algum momento isso para de ser uma sensação boa eu paro e começo com outra coisa.



Aqui no Brasil estamos vivendo a expectativa de grandes festivais no segundo semestre do ano. Você acha que é melhor tocar em grandes palcos?


Pode ser uma exposição maravilhosa com a oportunidade de alcançar um público maior. Mas você também divide o tempo do festival com várias outras bandas.
Isso pode diminuir o foco das pessoas. Mas é uma coisa maravilhosa estar rodeado por tantas pessoas querendo e sentindo algo próximo de uma experiência hiper-telepática. Todo mundo está com a cabeça em sincronia com os mesmos sons. As pessoas deveriam viver essa experiência pelo menos uma vez na vida, se não mais. Mas esses mesmos pensamentos podem ser aplicados a pequenos shows.
As bandas só têm de trabalhar mais para fazer com que todas as pessoas sintam isso tudo.



A banda já apareceu em lista de um blog brasileiro (Power Pop List), dos 100 melhores álbuns e EP's de 2009. Como também em sites europeus. É claro que vocês tem tocado os corações do povo de cada país. A música de todos esses lugares influencia o som da banda?


É mais fácil com a internet descobrir músicas destes lugares. Seu site tem sido fundamental para me expor aos artistas brasileiros. Eu nem sempre compreendo tudo, mas eu tenho um conhecimento básico de francês e espanhol e tento aplicar sempre, leio blogs da Itália ou do Brasil. Espero que muitas outras bandas destes lugares diferentes entrem em contato conosco e compartilhem sua música. Estou sempre com fome de novidades.
O mundo está ficando cada vez menor.
Esta poderia ser uma vantagem.




Há muita poesia nas letras das canções. Quem você gosta de ler?



Meu gosto tem variado ao longo dos anos. Quando eu era muito jovem meu pai era muito insistente para que eu lesse Dickens e Twain. Na época era difícil e não muito divertido. Mas agora eles são alguns dos meus livros favoritos, especialmente Twain. Seu senso de humor é muito americano. Rude e engraçado. Mas ele realmente entendia a tristeza e luta. Ler Wilde foi um pré-requisito para qualquer fã de Smiths. Eu gosto do que tenho lido até agora de Roberto Bolaño. Eu adoro as histórias de fantasia de HP Lovecraft, Robert E Howard.
Jonathan Carroll é infinitamente inventivo e um prazer de ler. Eu adoro ler biografias musicais. É emocionante e comovente saber sobre a aprendizagem dos seus artistas favoritos. O livro tem apenas que só tem que despertar meu interesse.
Eu leio muito sobre a filosofia e a religião também.



Novamente, as letras. Quando lemos as palavras como: "He's always alone in dance halls he's lining his eyes in pencil he's given his heart away just answering the phone" ("Ele está sempre sozinho em salões de dança, está alinhando seus olhos com lápis, ele deu seu coração apenas atendendo o telefone" (The Queen Himself)) ou"Living on the edge but needing answers I've got your picture on the wall above the phone in case you call too much rope I slip and tumble other voice s other rooms stay the tide from hidden moons" ("Vivendo no limite, mas necessitando de respostas, eu tenho a sua foto na parede acima do telefone no caso de você achar que é corda demais e eu escorregar e cair. Outras vozes outras salas, podemos suspender a maré na lua escondida "(Our Song)), podemos realmente ver um monte de imagens dos lugares e das pessoas. Você acha que as músicas são feitas para levá-lo a todos esses outros lugares ou tem a ver com despertar sentimentos com imagens?



Acho que ambos. Para levar o ouvinte ao lugar onde você está no coração da música e também para despertar essas sensações e emoções. Eu sempre disse meio brincando que o meu único e verdadeiro objetivo é fazer alguém chorar e sorrir ao mesmo tempo. Tenho sido levado pela música desta forma, a sensação quando o seu coração parece que vai te levantar do chão ou simplesmente rasgar livre de seu peito. A música é mágica. É a minha religião. Não há outra maneira de explicar o êxtase dela.


Quando é que vocês vêm tocar aqui no Brasil? Algum plano?

Nós gostaríamos de tocar no Brasil. Falamos do seu país e Espanha o tempo todo. Somos totalmente auto financiados, por isso vai depender apenas das passagens aéreas.
Mas talvez no próximo ano.
Depende de obter todos os detalhes e acertá-los. Vou ter que descobrir com você onde são os bons lugares para tocar e como é para locomover-se de um lugar para outro. Seria muito emocionante. Continuem compartilhando nossa música e isso fará nossa ida mais real.
Mas por agora, não deve ser antes disso.